quinta-feira, 23 de abril de 2015
A presidente da República, Dilma Rousseff, ajuizou no
Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação direta de inconstitucionalidade
contra a Emenda Constitucional (EC) 74/2013, que conferiu autonomia
funcional e administrativa às Defensorias Públicas da União (DPU) e do
Distrito Federal. A ação afirma que a emenda, de iniciativa parlamentar,
violou o artigo 61 da Constituição Federal. O dispositivo prevê que são
de iniciativa privativa do presidente da República as leis que
disponham sobre servidores públicos da União e territórios, seu regime
jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria. A ação
direta de inconstitucionalidade é assinada pela presidente Dilma
Rousseff e pelo advogado-geral da União Luís Inácio Adams. Para eles, o
texto da Emenda Constitucional apresenta vício de iniciativa e viola a
separação de poderes. A presidente pede, liminarmente, que seja suspensa
a eficácia da emenda, que terá impacto direto na atuação da Defensoria
Pública. Na ação, Dilma indica que o Conselho Superior da Defensoria
Pública da União estendeu aos defensores públicos federais o pagamento
de ajuda de custo para moradia concedido apenas à magistratura. “O
periculum in mora se expressa, portanto, na iminente lesão ao Erário: a
vantagem, uma vez concedida e percebida, muito dificilmente poderá ser
desfeita e o expressivo montante de recursos que serão despendidos pela
União será de difícil recuperação aos cofres públicos”, justifica. A
relatora da ação é a ministra Rosa Weber.
A ação direta de inconstitucionalidade é
assinada pela presidente Dilma Rousseff e pelo advogado-geral da União
Luís Inácio Adams. | Foto: Agência Brasil
O chefe da DPU na Bahia, defensor Átila Ribeiro Dias, ao Bahia Notícias,
afirmou que a ação pode ser encarada como uma represália a atuação das
defensorias públicas no Brasil. “A Defensoria Pública acaba litigando
contra o próprio governo, contra a própria União. Como é que vou querer
valorizar uma instituição que combate os erros que eu estou cometendo?
Qual é o interesse que a União tem de querer fortalecer uma instituição
que está ingressando com ações em face de irregularidades cometidas pelo
INSS – que é o carro chefe de reclamações da instituição? Qual é o
governo que vai querer uma instituição que venha a combater todas as
irregularidades cometidas pelo programa Minha Casa, Minha Vida?”,
questiona o defensor, explicando que a DPU ingressou com uma ação contra
Caixa, pois fazia inúmeros contratos com construtoras, que quebravam, e
a Caixa dizia que não era responsabilidade dela. “A DPU entrou com essa
ação, e ganhou. A Justiça reconheceu que a Caixa é responsável pelos
imóveis, caso a construtora não arque com suas responsabilidades”,
pontua. A gota d’água para o ingresso da ação contra a autonomia da
Defensoria, segundo Átila Ribeiro, foi o ajuizamento da ação contra o
Fies, por ter travado o sistema e impedir o aditamento de contratos de
estudantes que utilizam o financiamento estudantil.
Átila Ribeiro Dias, defensor-chefe na Bahia | Foto: Bahia Notícias
O defensor explica que a instituição
foi formalmente criada em 1994, e que, enquanto esteve atrelada ao Poder
Executivo, realizou o primeiro concurso público apenas em 2002. “Nesse
período de oito anos, o governo federal nunca teve interesse na
Defensoria Pública. A DPU só possui 555 defensores em todo país. Para
você ter uma ideia, somente no estado da Bahia, tem cerca de 300
defensores estaduais”, compara Átila. “Verifica-se que a DPU cresce a
passos de tartaruga, sendo que a Defensoria exerce uma atividade
importante, que é voltada, de forma específica, para pessoas sem
condições financeiras, hipossuficientes”, diz. Segundo o chefe da DPU na
Bahia, como o Executivo não valorizava a instituição, o Congresso, em
2004, propôs uma emenda à Constituição para dar autonomia para as
defensorias. Entretanto, na época, o governo entendeu que essa autonomia
só era possível para as defensorias estaduais. Somente em 2013, o
Congresso propôs que se fosse dado autonomia às Defensorias Públicas da
União. A retirada da autonomia, segundo
Átila, pode impactar no atendimento jurisdicional ao cidadão. Na Bahia,
há apenas 24 defensores públicos federais, sendo que 20 estão lotados
em Salvador, para atender as demandas de todas as áreas, abrangendo a
região metropolitana de Salvador. Fora isso, há apenas sedes em Feira de
Santana e Vitória da Conquista. As demais cidades do estado são
atendidas por defensores em ações itinerantes. A autonomia da
instituição permite que o gestor local faça as adequações necessárias
para atender os locais com maior demanda, como em Guanambi, que, por
ausência de defensores públicos da União, vivenciou casos de advogados
que supostamente extorquiam clientes que ingressavam com ações contra
Previdência Social. O defensor pontua que se a ação for julgada
procedente pelo Supremo, haverá impacto no orçamento e na administração
do órgão, que voltará a ficar submetido ao Ministério da Justiça. O
maior impacto, entretanto, seria no atendimento ao cidadão e ao
cumprimento da EC 80, que estabelece a disponibilização de pelo menos um
defensor público em cada comarca do país no prazo de oito anos. “Aqui
não é uma luta de classe, não é uma luta do defensor X, é uma luta do
Estado brasileiro. O único objetivo da defensoria é ajudar as pessoas
mais carentes, que são a maioria em nosso estado. O estado da Bahia é
muito pobre”, assevera.
A ministra Rosa Weber é a relatora da ação | Foto: STF
É
através da autonomia e da possibilidade de se propor o próprio
orçamento que se pode ampliar o atendimento no país, conforme afirma
Átila Ribeiro. O orçamento da instituição foi votado neste mês de abril,
mas ainda não foi sancionado. Entretanto, ele garante orçamento para
criar 20 unidades no âmbito federativo. “Se a ação for deferida, esqueça
tudo isso”, sinaliza. “Todos os anos, sempre ocorre cortes no
Orçamento. Quando a Defensoria estava vinculada ao Poder Executivo,
quando ocorria esses cortes, a DPU era a primeira a sofrer. O governo,
ao mandar o Orçamento para votação, já cortava em 20% o recurso da
Defensoria”, conta. “Com a autonomia, não existe esse corte automático
no orçamento”, frisa. A ministra Rosa Weber
pode decidir monocraticamente a ação, que depois poderá ser submetida ao
plenário do STF. Átila acredita no indeferimento. “Eu acredito que essa
liminar vai ser indeferida, porque o próprio Poder Judiciário conhece a
realidade da Defensoria Pública e sabe o quanto é necessário ter uma
autonomia”, fala. Para ele, a tese apresentada pela presidente “não tem
viabilidade jurídica”. “A Constituição determina que não se pode propor
ação contra clausulas pétreas, e a estrutura da Defensoria é clausula
pétrea. Essa tese da ação é tão esdrúxula, que se cai a EC 74, cai o
80”, esclarece. “Para a imprensa, o governo diz que está apenas
discutindo a autonomia, só que depois, ao retirar essa autonomia, é ele
quem vai dizer quando vai disponibilizar defensores públicos nas
comarcas do interior. Nós acreditamos que essa liminar seja indeferida,
tendo em vista que é um verdadeiro retrocesso”, finaliza.
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